domingo, 10 de maio de 2009

Absurdos, absurdos.

"- Doutor, meu irmão pensa que é uma galinha.
- Mas e por que você não o interna?
- Eu deveria, mas preciso dos ovos."

Tenho de tomar cuidado para não fazer deste recinto uma homenagem incansável porém maçante a Woody Allen e seus filmes, dada a importância que têm eles em meu momento atual, mas deixar de escrever sobre Annie Hall (1977), no Brasil, com o lamentável título de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, é deixar de escrever um pouco sobre mim, também.
É com a piada acima transcrita que Alvy (Woody) conclui não só o filme, mas tantas questões fundamentais acerca dos relacionamentos; são absurdos, sem sentido, motivo para dores, frustrações e tristezas, sem lógica alguma, mas no fim, precisamos dos ovos.
Não é um filme otimista, e quem o assiste junto ao parceiro corre o risco de incorrer na constatação sempre ciente mas nunca notada de que o amor entre eles pode bem, por motivo algum, ou por motivos vários, desfazer-se aos poucos em amargura, e, por fim, em nada mais. Mas aqueles pouco afeitos a sentimentalismos e fofuras cinematográficas, e que pedem ao cinema não escape, mas um trato maduro e artístico da realidade, verão no final do filme o viés de esperança que a vida, em toda sua dureza e falta de justiça ou injustiça, proporciona àqueles a ele atentos.
As diversas fases e facetas de uma história entre duas pessoas é contada da maneira mais coerente possível: sem qualquer lógica. Em uma cena, lagostas vivas sendo postas ao fogo como pano de fundo a tudo de mais alegre e sem razão que pode ocorrer entre um casal; em outra próxima, um diálogo amargo sobre o porque de não se conseguir fazer sexo sem antes fumar maconha. E assim a história entre Alvy e Annie nos é mostrada dentre os limites pouco nítidos do absurdo que é a soma dos absurdos individuais de cada um. É amor? Sem dúvidas que sim, absurdo esse que nos ultrapassa e transcende todos outros nossos, até nos tornar, nós também, absurdo maior que não pertence a um nem a outro; o amor é o absurdo que só aos dois pertence, nenhum dos dois explica, e do qual ambos não podem escapar, até que para um deles o absurdo se faça razão, e na razão o amor desfalece e se desfaz. Absurdos, absurdos.

Mais eu escreveria, mas acabou que gostei de terminar o corpo do post com "absurdos, absurdos", serviu bem ao propósito inicial do texto, por pura sorte, pois premeditado nada foi. Assistam ao filme, se confiarem aqui na dica, e eu diria que o fizessem.
Cá eu procuro no chão, entre tantos ovos partidos, se nos restaram alguns que façam do nosso absurdo ainda pergunta digna de ser vivida. Interrogações para nós, portanto.

Fiquem, por fim e finalmente, com essa cena do filme, que nada estraga surpresa alguma, mas é presente para esses que restaram até o final do texto, e lembrem-se então dos seus velhos tempos, com quem quer que tenham sido eles vividos.




Seems like old times, having you to walk with
It seems like old times, having you to talk with
And it's still a thrill just to have my arms around you
It's just like old times, dinner dates and flowers
Its just like old times, staying up for hours
Making dreams come true, doing things we used to do
It seems like old times, being here with you



5 comentários:

  1. Eu vi esse filme por indicação sua,
    assisti umas 3x :D

    Assim como um relacionamento,quando assisto esse filme,
    não quero que ele acabe nunca :(

    Já leu 'conversas com Woody Allen'?
    ele fala sobre cada filme,criação,elenco,trilhas,gostei muito :]

    e eu que só conhecia o woody por alguns recados que vc mandava falando sobre...
    foi ótimo pra mim aprender um pouco mais sobre esse baixinho nervoso.
    :*

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  2. linda essa cena dela cantando. lindo o filme todo. me marcou imensamente. adorei o texto, deu vontade de assistir ao filme de novo.

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  3. Dormi vendo Annie Hall. Achei maçante, insuportável e cheio de piadas internas, o que incomoda bastante. Não sei como achei ele tão bom nas tuas palavras, parecia outro filme. E é por isso que pretendo vê-lo de novo. De resto, Diane é linda.

    Abraços,
    Diogo.

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  4. Daniel, confesso que meu inxirimento ia permanecer anônimo, mas esse seu texto, junto com sua sensibilidade e percepção de coisas tão sutis, vale meu acanhado comentário.. Primeiro, tenho certeza que suas incansáveis homenagens ao Woody (percebe a intimidade, né? haha) nunca serão maçantes, porque você conseguiu captar o melhor, o tocante, o que importa. E é por isso que meu comentário vem acompanhado de um 'parabéns': por ter conseguido prender meus olhos na tela do computador, por ter escrito um texto belíssimo com o qual me identifiquei demais - e isso é mesmo um elogio, sinto falta ultimamente de referências assim -, por escrever tão bem... (:

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