Recife nunca fica tão linda quanto em dias de chuva. Por mais autêntico que seja o azul no céu de um dia de sol, acabamos por nos render à estafa de por todo o dia, e todo dia, termos nossas miudezas menos radiantes constrangidas por uma beleza que não admite oposição. O sol em Recife é absoluto, e impõe a promiscuidade de uma alegria úmida comum a todos - é contrastante e quase marginal a intenção apenas de contrariá-la, com o cinza de um rosto ou de alma.
Por isso, em uma manhã de chuva como essa, cá com meu café por testemunha, aproveito a distração da tantas vezes constante vigília solar, e liberto pelo recinto as melancolias tantas que de outra forma estariam onde não posso vê-las, mas sentiria o pus que têm por hábito cultivarem quando em companhia somente delas mesmo. E que diferença é vê-las, notar seus traços e o que de belo se perde entre eles. É por demais óbvia a beleza de um céu azul; maior mérito é revelar a si mesmo o quão bonito pode ser seu interior em cinza.
E em um diálogo matinal com todas elas, ou com as que se deram ao atrevimento de mostrarem-se, nelas descubro o que me distingue e me define, desmistifico-as e percebo que talvez melhor esteja eu com elas. E que eu não precise de uma rara manhã cinzenta para perceber o quão eu triste eu seria sem minha tristeza.
Ao contrário do que dizia Raul, a chuva não é minha amiga. Não que eu não goste dela, ao contrário, até admiro sua beleza e acho interessante seus tons frios. Acontece que volta e meia chove quando eu quero sol. Oh, o amigo sol.
ResponderExcluirAbraços,
Gabriela.
Sempre que eu tô ouvindo Portishead eu me imagino andando no centro do recife em dia de chuva (:
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